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stress,dadaísmo e pãezinhos mofados

quarta-feira, dezembro 14, 2005

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A Febre Hakim Bey, por Cláudio Tognolli
Cláudio Tognolli é um dos maiores jornalistas investigativos do país. Mestre em psicanálise e doutor em filosofia das ciências, tem três livros publicados e prepara outros três. Já fez reportagens em mais de 30 países, trabalhou na Folha de São Paulo, Veja, Rádio CBN, Rádio Jovem Pan, Jornal da Tarde, revista Caros Amigos, entre outros veículos de comunicação. É colunista do portal AOL, onde escreveu sobre Hakim Bey, autor dos livros Caos ? Terrorismo Poético e outros Crimes Exemplares e TAZ ? Zona Autônoma Temporária.

O texto foi publicado na coluna do dia 25 de novembro, e busca uma explicação para a ?febre Hakim Bey?, que levou alunos de Tognolli a criar sites contraculturais e depertou o interesse do jornalista. Para ele, Bey ?é uma antologia de protestos simbólicos num mundo sem grandes causas [...]. Parece aquilo que os simbolistas viam na civilização e a que chamavam de "ennui", ou náusea adocicada, tão bem herdada por Sartre. Parece aquilo de que sofria o personagem Jacinto, de Eça de Queiroz: porre de civilização.?

A febre Hakim Bey

Num mundo sem grandes causas, manifesto pelo terrorismo poético propõe atos como dançar de forma bizarra nos caixas eletrônicos dos bancos, rabiscar poemas nos lavabos dos tribunais e deixar arte-xerox sob o limpador de pára-brisas dos carros estacionados
Por Claudio Tognolli

Vicente de Carvalho escreveu em seu Velho Tema: "Essa felicidade que supomos/Árvore milagrosa que sonhamos/Toda arreada de dourados pomos/Existe, sim: mas nós não a alcançamos/Porque está sempre apenas onde a pomos/E nunca a pomos onde nós estamos".

Não deixa de ser bizarro que tanto o Manifesto do Partido Comunista quanto o Sermão da Montanha enveredem pelo mesmo blá-blá-blá, postulando um reino de igualdade que diz não a homens ricos e vindica uma igualdade, que para Cristo era no Paraíso e para Marx ocorrida na abolição técnica do capital (a que Rosa Luxemburgo preferia chamar de colapso após uma revolução estrutural).

Recebi um manifesto que de quatro anos para cá tem feito muito sucesso na figura de Hakim Bey. A editora que o publica no Brasil assim o define: "Não há fotos de Hakim Bey. Milhares de histórias a respeito de quem ele seria correm soltas pela Internet. A mais freqüente diz que Bey teria sido um poeta em algum lugar do norte da Índia, que, por questões políticas, fora obrigado a fugir para a Inglaterra e depois, devido ao envolvimento em uma ação terrorista, teria se refugiado em Nova York. Sabe-se que ele viveu muito tempo no Irã, mas suas atividades nesse país ainda continuam um mistério. Quando a Times tentou entrevistá-lo, Bey se recusou e passou um tempo desaparecido. Mas nada disso impediu que se tornasse um dos autores mais discutidos do mundo atual".

Bey defende a "Associação para a Anarquia Ontológica". Ou seja: Terrorismo Poético, Paganismo, Arte-Sabotagem, Misticismo, Pornografia, Crime.

Assim recebi a conclamação por Hakim Bey: "Dançar de forma bizarra durante a noite inteira nos caixas eletrônicos dos bancos. Apresentações pirotécnicas não autorizadas. Land-art*, peças de argila que sugerem estranhos artefatos alienígenas espalhados em parques estaduais. Arrombe apartamentos, mas, em vez de roubar, deixe objetos Poético-Terroristas. Seqüestre & o faça feliz. Escolha alguém ao acaso & o convença de que é herdeiro de uma enorme, inútil & impressionante fortuna - digamos, 5 mil quilômetros quadrados na Antártica, um velho elefante de circo, um orfanato em Bombaim ou uma coleção de alquimia. Mais tarde, essa pessoa perceberá que por alguns momentos acreditou em algo extraordinário & talvez se sinta motivada a procurar um modo mais interessante de existência. Coloque placas de bronze comemorativas nos lugares (públicos ou privados) onde você teve uma revelação ou viveu uma experiência sexual particularmente inesquecível etc. Fique nu para simbolizar algo. Organize uma greve em sua escola ou trabalho em protesto por eles não satisfazerem a sua necessidade de indolência & beleza espiritual".

Vi alunos que, de tão iluminados por Hakim Bey e seus conceitos, criaram no último mês dois sites no mínimo contraculturais, que valem a pena ser visitados: www.zonativa.com e www.olhosatentos.com.br. O primeiro trata de arte nas ruas. O segundo, de mulheres de rua sem mercado de trabalho.

A teoria de Bey vindica que o Terrorismo Poético pode ser "poemas rabiscados nos lavabos dos tribunais, pequenos fetiches abandonados em parques & restaurantes, arte-xerox sob o limpador de pára-brisas de carros estacionados, slogans escritos com letras gigantes nas paredes de playgrounds, cartas anônimas enviadas a destinatários previamente eleitos ou escolhidos ao acaso (fraude postal), transmissões de rádios-piratas, cimento fresco".

O marxismo parece, após o PT no poder, ter virado Groucho-Marxismo. E a própria Igreja Católica mete os pés pelas mãos com cada vez mais denúncias de pedofilia entre os seus condestáveis corifeus, prelados e cardeais.

As pessoas buscam o Sermão da Montanha e outros manifestos em lugares que quase sempre são os que elas não estão. Como no poema de Vicente de Carvalho.

Por isso Hakim Bey tem acontecido como uma febre: é uma antologia de protestos simbólicos num mundo sem grandes causas, sem respostas ortodoxas. As pessoas se voltam para epifanias do dia-a-dia, num protesto em que formas prescindem de conteúdo. Parece aquilo que os simbolistas viam na civilização e a que chamavam de ennui, ou náusea adocicada, tão bem herdada por Sartre. Parece aquilo de que sofria o personagem Jacinto, de Eça de Queiroz: porre de civilização.

É a herança que nossos Bushs e Severinos nos deixam.

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